Uma nova pesquisa finlandesa mostrou que a prática de exercícios físicos pode melhorar a conectividade das sinapses do cérebro por até 15 dias. Os resultados reforçam a teoria de que a nossa atividade mental está intimamente ligada ao estilo de vida. Além de uma vida não sedentária, a qualidade do sono e até mesmo o humor podem estar relacionados a um bom funcionamento neurológico.
A conectividade do cérebro é uma medida científica que traduz a nossa capacidade de realizar sinapses, e é consequência direta da quantidade de neurônios no cérebro. Ela também está relacionada com a nossa capacidade de raciocínio, na medida em que reflete aspectos como o poder de atenção, a memória e a faculdade de encontrar relações entre diferentes tópicos.
Os pesquisadores finlandeses partiram de duas perguntas essenciais. Em primeiro lugar, eles queriam saber como os fatores comportamentais, fisiológicos e de estilo de vida influenciam os padrões de conectividade do cérebro do voluntário no dia seguinte. Depois, queriam saber se esses efeitos perduram e por quanto tempo.
Para responder a essas duas perguntas, uma série de desenhos experimentais foi adotada, envolvendo a coleta de dados de um voluntário por meio de celulares e gadgets pessoais, um smart ring (anel inteligente) e um monitor de pulso. Também foram feitos 30 exames de ressonância magnética funcional (fMRI) medindo atenção, memória, estado de repouso e os efeitos de estímulos naturalistas em cada pessoa. Também foi submetido a testes psicomotores.
A combinação de análises por fMRI e gadgets pessoais é uma das principais inovações do trabalho. Em estudos cerebrais tradicionais, as imagens instantâneas da atividade cerebral são limitadas e não podem capturar as mudanças diárias no cérebro. Quando combinadas com os dados de um equipamento de uso diário, entretanto, é possível estudar com mais detalhes a interação dinâmica entre cérebro e comportamento.
“Obtemos essa imagem incrível do que está acontecendo em ambientes controlados de laboratório versus o que está acontecendo fora do laboratório e como eles se relacionam”, afirma Ana Triana, principal autora do estudo e pesquisadora da Universidade Aalto. Os resultados foram publicados na revista científica Plos Biology.
Os resultados da pesquisa adicionam mais evidências ao fato que a conectividade do sistema nervoso, ou seja, a capacidade do nosso cérebro de fazer conexões entre suas diferentes áreas, está relacionada a fatores externos a nós.
A dinâmica do ambiente no qual estamos inseridos, o nosso estilo de vida, qualidade de sono ou o acometimento de doenças, todos são elementos capazes de influenciar nossa clareza de raciocínio.
Triana espera que nos próximos anos novos estudos sejam conduzidos utilizando a mesma metodologia. “O fato de podermos observar essas interações dinâmicas entre comportamento, fisiologia e cérebro cria tantas perguntas”, afirma.
Ela revela que o próximo passo será estudar as interações entre ambiente e cognição de pessoas com transtornos mentais. “Isso abre a possibilidade de entender melhor a dinâmica dos transtornos mentais e possivelmente começar a fornecer mais ferramentas para os médicos orientarem suas decisões sobre tratamento personalizado.”
Varley Costa, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pesquisador em psicologia do esporte, afirma que existem, essencialmente, dois mecanismos pelos quais a atividade física influencia o funcionamento do cérebro.
Um deles é por meio do favorecimento do fluxo sanguíneo, que passa a fornecer mais oxigênio de nutrientes aos nossos neurônios, melhorando o funcionamento cognitivo. Também existe um mecanismo chamado neurogênese, que diz respeito à capacidade de formar novos neurônios e células nervosas que afetam diretamente a conectividade cerebral.
Embora a pesquisa finlandesa tenha se concentrado nos efeitos em até 15 dias, as consequências benéficas dos exercícios podem ser ainda mais longevas. “Quando você faz atividade física, você está colhendo a curto prazo, mas você também está plantando a longo prazo”, afirma Costa.
Um trabalho americano publicado neste ano na revista Neurobiology of Aging apontou que a prática de exercícios durante a meia-idade pode trazer benefícios até mesmo na velhice. Com dados de 158 idosos de um estudo de coorte (a PREVENT-AD), os pesquisadores observaram uma maior conservação da massa cinzenta entre os participantes que tinham histórico de uma vida ativa.
Mas não são apenas os adultos que se beneficiam da prática de atividade física. Uma ampla revisão de estudos científicos, publicada na revista Children, mostra uma clara associação positiva entre exercícios e capacidade congnitiva para crianças e adolescentes de origem latino-americana (residentes nos Estados Unidos) com idades entre 5 e 18 anos. Outro aspecto que pode ser observado para os pequenos foi a performance escolar, melhor entre os não sedentários.
Com a metodologia desenvolvida pelo grupo de pesquisadores finlandeses, estudos como esses podem trazer, no futuro, resultados mais detalhados que nos ajudem a compreender melhor a intrincada relação entre o ambiente e o funcionamento do nosso cérebro. O que já se sabe é que a prática de atividade física é benéfica tanto para o corpo quanto para a mente.
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Fonte: O globo